E ali no baile ela sorria, mas temia ser puxada pra dançar. O salão era antigo, janelas de mosaico, lustres de fogo vivo e idade avançada, assim como os dançarinos que pareciam dar movimento à superfície concreta, arrastando pés enrugados, mas ágeis como o tempo. Tudo ali era paradoxal. E mais, tudo aquilo vida. Bastava fitar os olhos na multidão pra constatar isso.
A mesa vazia, as cadeiras desocupadas - a não ser a que ela mesma ocupava -, a primavera vermelha no centro da mesa, os guardanapos intactos, o sabor do nada e a sensação de tudo. Por que dançar se os seus olhos perderiam metade do movimento? Pois então veria bem apenas seu par ou suas próprias pernas ou seus próprios braços, e o espetáculo não seria tão bom quanto aquele que ela enxergava deslumbradamente de sua cadeira.
Seu corpo paralisado, mas sua alma como rebolava! Efeito da correnteza de recordações que aquelas canções e suas batidas traziam para ela. Pois foi num baile como esses que conhecera seu primeiro grande amor, aquele que a fizera deslizar por tantos salões nas baladas da juventude. Brilhavam eles! Brilhavam olhos! E ofuscavam todo o restante da massa rítmica, apesar de cada outro se considerar um par de estrelas, sobre o palco onde caberiam apenas os dois amantes, dançarinos da última das noites.
Seu corpo paralisado, mas sua alma como rebolava! Efeito da correnteza de recordações que aquelas canções e suas batidas traziam para ela. Pois foi num baile como esses que conhecera seu primeiro grande amor, aquele que a fizera deslizar por tantos salões nas baladas da juventude. Brilhavam eles! Brilhavam olhos! E ofuscavam todo o restante da massa rítmica, apesar de cada outro se considerar um par de estrelas, sobre o palco onde caberiam apenas os dois amantes, dançarinos da última das noites.
Ademais, revelar sua destreza seria trair o cavalheiro que não estava mais ali. Seria acender fantasias daqueles outros homens, pois era divina na arte dos pés e dos quadris e o sabia perfeitamente. Ela era realmente boa naquilo. Mas só havia chegado a tal ponto por causa dele e de mais ninguém. Padilla era homem para a vida toda, companheiro para todos os bailes, como eles mesmo haviam jurado numa das ternas noites de tempo seco e suor fugaz. Foi o bom homem por toda vida, mas talvez soltara as mãos da dama cedo demais. "Um passo pra direita, outro pra trás..." "Seu pé! Perdão, sou uma desengonçada mesmo..." "Se for melhor para ti, suba nos meus pés..."
E como sorria aquele homem! Sabia convencer a Lua em fazer-se cheia sem dizer uma palavra. E certamente o faria a ela em plena praça, não por ser a que primeira amara, mas para a qual ele não significaria apenas mais um trovador. Eram serenata, os dois. Juntos, para a Lua. E, juntos, especialmente, para o piso dos salões de baile durante os memoráveis anos dourados.
- Aceita uma bebida?

- Aceita uma bebida?

Começo aqui um romance, daqueles melosos mesmo, produto das minhas idas a campo.
A pesquisa é sobre os bailes da Terceira Idade. A personagem principal dessa história é uma das senhoras que observei ali na União Fraterna, mulher sorridente que esteve sozinha numa mesa durante o baile todo. Algo nela me chamou a atenção.
A pesquisa é sobre os bailes da Terceira Idade. A personagem principal dessa história é uma das senhoras que observei ali na União Fraterna, mulher sorridente que esteve sozinha numa mesa durante o baile todo. Algo nela me chamou a atenção.
9 comentários:
Vejo que essas idas a campo estão transcendendo ao teor "simplesmente" acadêmico da pesquisa.
Deleitei-me outra vez com suas palavras. Toda a precisão e poder de encantamento de sua narrativa.
E não há nenhum demérito em romancear ou ser "meloso". Tudo se adapta a uma bela escrita. E a sua, por natureza, já é doce.
Sei lá, mas eu acho que também me ateria a alguém que ficasse mais destacado do baile: pra observar quem observa.
Um romance? oba!!
Escreva, escreva!
Não ligue, passei aqui de novo para ler algum dos seus textos!
Adorei esse, em especial; que fluidez narrativa! Me lebrou um filme a que você provavelmente já assistiu: "Chega de Saudade". É muito bonito, fala sobre os bailes de 3ª idade e as memórias, que são muito caras a mim.
Eu fiz uma matéria na Sociais na qual eu tinha que ir a campo também e foi uma época em que fiquei muito inspirado! Por que você tem feito campo? Faculdade também?
Beijos!
Isso aqui promete.
Que lindo!!! como já disseram, "que fluidez"
Buda, na apresentação, sexta, você podia ler esse texto como "relexão sobre o trabalho de campo"...a limonja ia pagar um pal, e a sala, então...ia começar a dançar!
Vale dizer que durante seu texto, eu meio que ouvia uma música, e quando entraram os diálogos, parecia que a música ficava mais baixa e as vozes mais altas, só as vozes do cavalheiro e da senhora!
Muito bonito!
me lembrou uma cena do filme "perfume de mulher", se não assistiu, assista! Muito bonito também!
Parabéns pelo texto, mais uma vez!
Beijos!!!
Caramba!
eu gostei muito!!!!!
parabéns Camila Budinha =D
esperava que você tivesse algum dom desse tipo, só não imaginava - apesar de suspeitar - que ele fosse tão grande, bonito e penetrante.
um grande abraço simbolizando um grande parabéns!
Thom
Fiquei muito feliz com os comentários de vocês, muito mesmo... Vocês me incentivam bastante, obrigadaa... mas pode saber que estou aberta a críticas das mais duras, não se acanhem!
E João, respondendo à sua pergunta: estava fazendo trabalho de campo pela faculdade, sim. Foi um trabalho com a finalidade primeira de aplicar os métodos e as técnicas de pesquisa qualitativa com que tivemos contato pelos textos e pelas aulas dos professores. Mas creio termos aprendido algo mais do que isso... Esse contato com a realidade dos "velhinhos" mexeu bastante comigo e acredito que com os demais membros do grupo também.
Quanto aos filmes, "Chega de Saudade" assistimos antes da primeira ida a campo que, por sinal, foi no local das filmagens: Uniao Fraterna. Foi bem útil para nosso primeiro contato, sim!
E "Perfume de mulher" ainda não assisti, mas to morrendo de curiosidade já, Dani!
E aí? Legal. Tem coisas novas pra por no ar? Eu curti.
E aí? Legal. Tem coisas novas pra por no ar? Eu curti.
Oi, Mauricio.
Desculpa. O trabalho de campo acabou e me inspiração parece ter ido embora junto. Mas quero continuar. Quando eu tiver algo novo te dou um toque, ok?
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