ronca


O corpo se posiciona: se proporciona. Olho para cima, estendo os braços e agora vôo em anos-luz por entre estrelas, astros brilhantes que nos permitem ir pra longe entre um piscar e outro. Escuridão parcial de uma caverna esplendorosa. Um feixe de luz transforma gotas stalagtais nas estrelas a que me refiro. E o Universo onde passeio é um canal de ar levemente ensolarado. Atravesso uma galáxia antes de me vestir.

A nudez dá um tom zen, novo, mas ancestral: eis que descubro a minha idade da pedra! Estamos todos nús e todos corpo e alma. Na serenidade astral e seriedade humana, ou o contrário, nos comunicamos. Estar nú é, ademais, vestir-se de algo novo. De contrapor-se a um hábito, a um mau hálito que é o pudor permanente. Abro a boca e esbanjo frescor vital.

Salto do trem voador e observo meu entorno: ao longe, separados de mim pelas pedras instáveis e água de correnteza arredia, sobem ainda nús, homens e mulheres, ao topo de uma coluna de pedra, sobre a qual repousam, um a um, em posição meditativa. A imagem e a caverna evocam muitas sensações. A imagem me toca a alma com toda a extensão sensível e a alma fotografa a caverna com toda minha luz e minhas sombras mornas.

Estou em êxtase e nutro uma curiosidade verdadeira e fatal: deixo que a correnteza escura me leve. Perco o controle do meu corpo, da minha direção, do que está para ser e vou. Estou adentrando a caverna em velocidade quando uma grande pedra e um braço atento me fazem parar. É quando percebo um medo: poderia ter perdido a volta logo adiante. Uma pedra mais pontiaguda, um mergulho maior. Essas águas são muito mais fortes do que meu corpo, do que minha vontade de permanecer entre vocês (que é o máximo que posso imaginar). As forças da natureza são sempre maiores. Não existem para serem desafiadas nem afinadas. Existem por continuar. Por seguir a corrente sempre anterior e materna. Mãe Harmonia, receptáculo da semente solar, arco-íris sem arquitetos. Observação sem medidas nem comparações.

A observação é o sim, que segue. Comunicação pacífica que me nutre de cores, de cheiros, amor pelos seres e alguma poesia lá dentro. A meditação é ser(pl)ena e inspira um movimento consciente. Constante. Que continua e libera, despindo-me para o presente.

Um comentário:

Mariana Menezes disse...

ser(pl)ena: lindo! mais incrível que as palavras em si, é o poder de 'transposição' que elas podem provocar. ai, me senti muito ali, com vocês. e, o curioso, neste momento, é que logo ali acima, bem próxima a mim, está a lua, gorda e lenta no céu.